Caderno inquieto

LITERATURA
Na superfície calma desses poemas, escritos com precisão e cuidado, há uma espécie de melancolia em que muitos de nós nos reconhecemos. Alguma coisa entortou no mundo, e já não é de hoje. Observar este cotidiano torto, que nos atravessa, é uma das artes do poeta Tarso de Melo. E nesse caminho ele deixa um travo amargo nos olhos e ouvidos do leitor.

Tudo parece fluir tranquilamente por essas páginas, poemas medidos no papel em branco, mas o parafuso vai sendo torcido a cada momento, e o poeta, com suas armas, seu arsenal de palavras e versos, vai se defendendo, armando uma barricada de sobrevivência.

Desde A lapso, seu primeiro livro de poemas, de 1999, Tarso se mostra um escritor que não constrói uma ilha isolada do mundo, da cidade, ou mesmo da casa, longe dos homens de carne e osso e de seus desejos, muitas vezes frustrados. É com determinação – e com noção da perda – que ele evita este isolamento, como registra no belo ”Outra ilha”: ”não aquela/ onde só e triste// bombardeio/ as pontes// que ligam/ a algo que// alguém diria/ mundo, não”. Deriva desta necessidade de ainda guardar a cabeça levantada, quando tudo em torno parece conjurar contra, a beleza de sua poesia.